quinta-feira, maio 08, 2008

Memórias. O Monte do Marquinho (1)

Ou todas as desculpas e mais algumas para não estudar Sig.

Guardo do Monte do Marquinho as memórias mais felizes da minha infância.
Foi aqui que morei dos dois aos sete anos. E era apara aqui, para a casa dos meus avós, que vinha nas férias grandes, e em todas as outras férias escolares, feriados ou sempre que não tivesse escola.

Era aqui que me sentia verdadeiramente feliz, embora acho que não tivesse consciência disso.
Na casa dos meus avós não havia água canalizada nem casa de banho.
Íamos ao poço buscar a água em cântaros de barro. Havia também uns cântaros maiores de plástico azul, mas esses por serem muito pesados, só o meu avô é que os utilizava. Eu tinha uma cantarinha de barro e um pequeno regador verde-claro que utilizava para ajudar a carregar a água, a regar as flores da minha avó e a dar água aos cães, galinhas e coelhos.

A questão da casa de banho era mais complicada. Primeiro tomávamos banho nuns grandes alguidares de plástico. Para nós, crianças, o alguidar era colocado no meio da cozinha que funcionava também como sala de estar e que era também a casa de entrada. Os adultos tomavam banho nos quartos.
Depois o meu pai e o meu avô fizeram uma espécie de uma barraca de madeira nas traseiras da casa com pouco mais de um metro quadrado, pelo que me lembro. Numa das paredes colocaram um balde de alumínio em que fizeram um furo para colocar o bico de um regador com uma torneira. Esse balde de alumínio deveria ter capacidade para cinco a dez litros. Quando queríamos tomar banho íamos buscar a água às panelas de ferro que estavam sempre ao lume, cheias de água. Depois com água fria amornávamos a água. E assim tomávamos banho com cinco ou dez litros de água. Lembro-me que quando entrei para a escola primária que ficava perto da nossa casa eu era das únicas, senão a única que tomava banho de chuveiro – aquilo a que hoje chamamos duche.

Quanto às outras necessidades, pois…
De noite utilizávamos um penico de faiança branca que se colocava debaixo da cama ou dentro de um compartimento próprio que existia nas mesas-de-cabeceira daquela altura. Durante o dia, íamos ao campo, atrás de uma oliveira, ou de um sobreiro.
O meu avô tinha expressões muito engraçadas. A expressão que ele utilizava quando nos queria dizer que ia fazer as suas necessidades era “arrear a calça”. Eu durante muitos anos perguntei-me o que quereria dizer esta expressão, mas não me lembro de alguma vez ter perguntado.

Eu e a minha irmã, arranjámos uma vez um bordo de uma grande talha de cerâmica, daquelas onde se guardavam as azeitonas. Como o bordo dessa talha tinha as dimensões adequadas adoptamo-la como nossa sanita. E sempre que a queríamos usar tínhamos de andar a perguntar à outra atrás de que oliveira a tinha deixado da última vez que a tinha utilizado.

E éramos tão felizes nessa altura. Pergunto-me o que seria de nós agora se, por algum motivo, tivéssemos que voltar àquelas condições.

No Monte do Marquinho fiz a minha primeira experiência científica.
Como ouvia dizer que a terra de se movia, decidi comprovar. O problema é que a minha noção de terra naquela altura era algo ingénua. Qual planeta Terra qual o quê. Assim, um belo dia, decidi escavar um buraco – deve vir daí a minha paixão por escavar buracos – e espetar-lhe um pau, decidida a observar as suas movimentações.
Não me lembro quantos dias ou semanas monitorizei aquele pau, que para minha grande desilusão se mantinha estático.




Esta é uma das minha imagens favoritas do Castelo. Em primeiro plano, vê-se o poço e o tanque da horta do Monte do Marquinho.

1 comentário:

Anónimo disse...

Este post deixa a lagrimita ao canto do olho.
Tempos bonitos. Quando lá morávamos pensava que seria melhor morar em Montemor, onde se tinha acesso a mais coisas. Eu queria ir para o rancho folclórico, para o balet, depois para as actividades da Oficina da Criança... Mas agora tb acho que foram uns belos tempos... ir apanhar azeitona, apanhar a fruta da árvore para comer logo ali, ver nascer os pintainhos, tomar banhos de tanque, ir passear ou apanhar bolota na herdade que ficava logo do outro lado da estrada... ir para escola primária a pé... No Inverno, a estrada, que era de terra batida, ficava com buracos que se enchiam de água. Nós, crianças, eramos equipados com botas de borracha para não chegarmos com os pés molhados à escola - o Picatojo. Eu adorava passar por dentro das poças de água. eh eh
Muitas lembranças !